sábado, 26 de fevereiro de 2011

A Beata, sua Mãe e Eu




(Pe. Guimarães)

Confesso, de cara, que a figura da Beata Ir. Lindalva ainda não me havia conquistado. Claro, a história da freirinha que é cortejada por um marmanjo, não lhe dá cabimento até que ele, movido pelo desespero e pela incômoda sensação de ser rejeitado, assassina a coitada, em plena Sexta-feira Santa, com  mais de quarenta peixeiradas, não deixa de ter um forte apelo dramático... É comovente, sim. Mas e daí? A mídia todos os dias mostra cenas violentas do cotidiano e a gente, pouco a pouco e sem perceber, vai ficando ligeiramente insensível diante de tais notícias.
Existem tão poucas informações sobre a pessoa da Ir. Lindalva que esses meros dados sobre o seu Martírio são insuficientes para despertar nas pessoas aquela admiração sincera e aquele desejo ardente de imitá-la. A única Biografia que eu conhecia “O sorriso de Lindalva” é tão fraquinha que posso dizer que se encaixa perfeitamente naquela categoria que Pe. Sátiro chama de “flor de laranjeira”.  Na internet encontrei alguma coisa, mas também insuficiente. Eu precisava de uma experiência pessoal com ela, alguém tinha que me falar alguma coisa da vida dela que me tocasse.
O Pe. Netinho, por diversas vezes, me convidou pra ir à sua Paróquia que tem ela e o São Cristóvão como padroeiros e nunca dava. Finalmente, no último dia 29 de Dezembro eu fui.  Cheguei em cima da hora da Novena começar e o encontro com toda a  equipe de Liturgia na calçada da Matriz já prontos para entrar. Tão logo me paramentei ele me dá as coordenadas da Celebração e me avisa que a mãe da Beata está presente com alguns irmãos. Meu Deus, aquilo era uma grande novidade para mim... eu nunca havia antes celebrado com a presença de familiares do padroeiro ou padroeira. Entramos em procissão solene numa Igreja que não estava lotada. Sobretudo os bancos da frente... alguns deles estavam vazios. Eu havia sido avisado que a incensação só seria feita depois que a imagem da Beata entrasse. Tudo bem. Até então, tudo tranquilo.
Quando, após os Ritos Iniciais, a imagem entra conduzida pelos noiteiros, eu senti uma coisa estranhíssima: uma sensação de que, de repente, o espaço físico estivesse totalmente preenchido quando, na verdade, tinha muitos lugares vazios ao meu redor, sobretudo em frente ao presbitério. Tentei interiormente definir aquela sensação e a palavra que me veio à mente foi plenitude. Eu olhava para aquela imagem tosca, até mal feita do ponto de vista artístico (sua mãe, D. Lúcia, me confessou depois que “não parece nem um pouco com ela”) e aquela cena tão simples foi me enchendo de emoção. Era o início de um processo de sedução.
Quando, durante a comunhão, o Pe. Netinho ao meu lado me diz baixinho que aquela que estava diante de mim para receber o corpo de Cristo das minhas mãos  era a mãe da Ir. Lindalva, eu não me controlei  e não pude mais conter as lágrimas. Era uma  mulher simples, do povo, cabelo ligeiramente desgrenhados, vestida humildemente, olhar sereno e profundo... contemplando-a assim, de perto, não tive dúvidas: a mãe é tão santa quanto a filha. 
Esta impressão foi confirmada quando, agora em janeiro, acompanhando a equipe da Gazeta do Oeste para fazer uma matéria sobre a Ir. Lindalva,   pude conversar mais à vontade e com mais tempo com ela. Perguntada pelo repórter se sentia orgulho da filha,  dá uma resposta que nos deixa atônitos: “Não.” Diante do nosso olhar perplexo ela completa: “Porque orgulho não é bom pra ninguém. Eu sinto alegria”. Eu olhava pra ela fascinado. Tá aí uma grande mulher. Agraciada por Deus de ter colocado no mundo uma santa, ela não se altera e nem se envaidece. Apenas agradece ao Senhor humildemente. Perguntamos se ela havia perdoado o assassino e ela responde calmamente: “Sim. Acho que ele era doente... dizem que tomava  remédio controlado. Meus filhos tiveram mais dificuldade... principalmente um. Mas agora acho que já perdoaram”.
Na oportunidade tivemos também, coincidentemente (?), contato com as Irmãs do Patronato de Pau dos Ferros onde a beata trabalhou por algum tempo. A Ir. Geralda nos conta episódios dessa época que tiraram  de mim aquela impressão de que a Ir. Lindalva era apenas uma freirinha assassinada por um louco. “Naquela época ela já era uma santinha”, diz a freira. A superiora do Patronato, a Ir. Fátima,  me diz que após sua morte a Congregação passou por um momento fértil e apareceram inúmeras vocações. Como se dizia no início do Cristianismo: “Sangue de mártir é semente de novos cristãos”. Martírio fecundo o da Ir. Lindalva.
Pronto. Agora a Beata havia me seduzido. Sua vida ganhava contornos precisos de uma verdadeira santa: cor, emoção, virtudes heróicas, gestos, palavras, atitudes¸ grandeza, enfim, santidade. E fico pensando naquela expressão: “Quem sai aos seus não degenera”. E me vem à mente a figura da sua mãe, D. Lúcia. Vejo-a sorrindo ao responder à pergunta se tinha esperança de estar presente à cerimônia de canonização em Roma: “É, se Deus quiser, eu vou. Já perdi o medo de andar de avião”.  E Deus há de querer. Eu também quero estar presente. Porque já sou devoto da nossa santinha.

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